29 de dezembro de 2010

À Década!


A última década levou consigo mais crenças arraigadas. Tenho a impressão de que nasci sabendo muito, e fui deixando muitas certezas pelos caminhos que percorri. Agora, vago vazio. Vago devagar. Descubro estar na melhor idade, principalmente por ser esta a única que tenho no presente.

Que a década que vem leve embora tudo o que faz estagnar o meu ser, e o de todos. Que sejamos lavados de nossas certezas dogmáticas, que entremos nos novos anos com dúvidas, feito crianças, querendo aprender para preencher os espaços vazios, e não como computadores com memórias cheias de mágoas, que nos fazem perder a crença e a vontade.

16 de dezembro de 2010

Visceral


E quando tudo era felicidade falsa, alguém sacou, de dentro de suas próprias vísceras, uma tristeza verdadeira. Amarga e quente como só as tristezas verdadeiras devem ser. Possivelmente pela dor que aquele movimento proporcionou, uma lágrima sentida escorreu pelas sua face, rolou pelos braços e, da ponta do dedo, saltou para uma morte única, achatando-se contra o chão. As unhas compridas começaram a coçar as veias saltadas, até que uma delas foi aberta, desperdiçando o doce sangue para fora de sua trilha quase inexorável.

14 de dezembro de 2010

O tempo de máquina e o tempo fora da máquina


A métrica de produção invadiu o ser humano. O tempo é artigo raro para todos, porque a vida moderna faz com que nos mantenhamos produtivos o maior tempo possível. Não existe part time job que renda aquilo que se precisa para sustentar a máquina. Vivemos pela e para a máquina, vivemos deixando a máquina funcionando em três turnos, como as melhores indústrias de todos os ramos. Porque produzir muito é premissa, produzir sempre é básico, e o preço sobe se o produto fica concentrado e raro, ele tem que ser aos borbotões, tem que invadir todos os nichos, tem que roubar mercado, tem que sobrar e não sobrar. Temos que vender mais por menos e o tempo todo. A cada vez dedicamos mais força para fora, e menos para dentro. Cada vez menos tempo fora da máquina. Cada vez acumulamos mais e mais funções, menos gente fazendo o trabalho de mais gente ainda, e vivendo uma vida sem consciência da verdadeira dimensão que o trabalho ocupa em suas vidas. Corporativos, mesmo que autônomos, mesmo que donas de casa, mesmo que crianças (sim, as nossas crianças e a competitividade quase nata, o excesso de atividades, a morte da ignorância abençoada). Fomos todos institucionalizados.