27 de maio de 2011

Cinderela volta ao Baile


Todas as suas roupas haviam voltado a ser os trapos que eram antes da intervenção da fada. Sua carruagem voltara a ser uma abóbora puxada por camundongos. Teria sido um sonho? Não, havia o sapato, o lindo sapato de cristal que perdera na fuga. Se ele estivesse em algum lugar, seria a prova que bastaria para que ela acreditasse.
Trajada como uma mendiga, Cinderela conseguiu entrar junto com pedintes que faziam fila para comer os restos do banquete, despejados pelo serviço da cozinha em grandes tonéis de lixo fedorento. Escondeu-se no quarto das vassouras, onde encontrou um traje das serviçais da festa. Armou-se de uma bandeja com copos, que usou como um escudo para que nem o príncipe nem ninguém visse seu rosto. Foi entrando, e ouvindo uma risada muito conhecida. A irmã adotiva se derretia para cima de seu príncipe, que àquela altura estava tomando champanha em uma taça muito diferente... era o sapato de cristal!!! Com os cabelos despenteados, roupas amassadas, marcas de batom... ela não podia acreditar! O canalha estava se esfregando em sua irmã postiça! O sonho se despedaçara. Largou a bandeja ruidosamente, sem se importar que a reconhecessem, quando percebeu o óbvio: ninguém se importava com a serviçal estabanada, mesmo porque todos os que haviam sobrado estavam bêbados e enamorados. Cinderela percebera então que o baile era uma grande desculpa para que os nobres se soltassem um pouco e, sob os efeitos do álcool, liberassem seus desejos reprimidos pelos seus cotidianos enfadonhos. Nada podia ser melhor. Cinderela não iria mais esperar sentada pelo príncipe, e foi-se embora. Naquela mesma noite, a moça enxotou sua madrasta e irmãs da casa que, afinal, era sua, e coroou-se a Rainha de seu Próprio Castelo.

8 de maio de 2011

Ficamos Seletivos

Na vida metropolita, urbana, selecionamos pessoas. Essa seleção vem com a idade, com a falta de tempo, com a distância geográfica, com a divergência/convergência de interesses. Não somos mais puros, não amamos as diferenças, só estimulamos a semelhança. A metrópole estimula infinitas possibilidades, diferentemente da vida rural, agrária, onde o filho herda a terra do pai, podendo mudar detalhes pequenos, mas ainda viviendo em uma comunidade menor, fazendo as coisas como sempre foram feitas.
A urbe mais afasta que aproxima. Em um primeiro momento, compramos imagens e ideias de urbanos se encontrando, se amando, se curtindo, imagens que estimulam a diferença como princípio, mas a cidade afasta, isola, cria ilhas de solidão, exagera na diferença,passa um pouco da conta. Os interesses pessoais são a primeira triagem: "é do meu meio? Vou ver sempre? Vai me ajudar? Então mantenho proximidade". Ainda nos interesses pessoais, correm na frente os afetivos, as relações amorosa e/ou sexuais, os sonhos de se encontrar alguém que nos veja da forma como queremos ser vistos. Os demais interesses vão entrando na fila, conforme sua prioridade.
Há tempos atrás, eu culparia o racionalismo exacerbado. Hoje vejo que a falta de razão, a falta de sermos "razoáveis", em um mundo injusto, onde o mérito que mais conta é o de ser esperto, são os reais motivos. Os grandes princípios humanos vão ficando para as novas como ideais inatingíveis, enquanto a corrupção e o "cuidar de si" são os regimes. E olhamos as fotos de dez anos atrás como lembranças de outra vida.